terça-feira, 26 de julho de 2011

CIÚME, o contrário do AMOR

CIÚME, o contrário do AMOR

“O amor tira a inteligência do confinamento das células
e abre os espaços da poesia.
O ciúme fecha sobre nós as portas da solidão.”
(Emmanuelle Arsan, A hipótese de Eros,
Editora artenova, 1975, tradução de Clarice Lispector)

Como os relacionamentos afetivos, e em alguns casos o ciúme, têm sido  temas recorrentes na clínica. Me aventurei a esboçar uma breve resenha de um livro muito elucidativo  sobre o assunto: CIÚME - O lado amargo do amor, de Eduardo Ferreira-Santos. Com o pouco tempo que cada um alega ter para a leitura, espero que esse trabalho resumido, alcance a compreensão e sirva como estímulo ao desenvolvimento pessoal de seus leitores.

O CIÚME frequentemente traz consigo muito sofrimento e consequentemente, vai minando a possibilidade de interação  com o parceiro e da relação da qual se pode desfrutar.
Inicialmente, num relacionamento amoroso, pode-se até ter a sensação de que o ciúme é prova de amor verdadeiro. O próprio Ferreira-Santos identifica esse tipo de sensação como algo que vem sendo construído ERRONEAMENTE pelo senso comum e que, invariavelmente, denota o início de uma perturbação no verdadeiro sentimento que pode ser compartilhado entre dois seres.
Como construir  um 'SER' (e  existir)  sem a presença e a interatividade de um outro SER? Essa relação de co-dependência entre os seres se estabelece desde o nascimento. Relacionamentos afetivos por essência são um excelente aprendizado para aqueles que compreendem que o compartilhamento de si próprio e a interação com o outro, no mesmo tempo/espaço, são fundamentos necessários ao desenvolvimento pessoal. O 'atrito' das emoções evocadas  pelos relacionamentos, podem ser objeto de reflexões e escolhas em prol da autenticidade e autonomia de qualquer indivíduo.
Imperdível o filme de Claude Charbrol, L'Enfer (1994),
        onde o processo de adoecimento do espírito amoroso
     e relacional de um jovem casal, recém-casado, é
          minunciosamente descrito em detalhes comportamentais
         e nuances afetivas sob a perspectiva dos dois cônjuges.
     Simplesmente IMPERDÍVEL !!!!
Pode-se com este ‘olhar para dentro’ (auto-conhecimento) conquistar novas possibilidades de existência mais apropriadas a quem as escolhe. Afastando-nos de respostas ‘automáticas’, geralmente, aprendidas no relacionamento primordial, onde fomos inseridos desde o nascimento e pelo qual aprendemos a nos reconhecer e a reagir frente aos fenômenos a nossa volta.
Uma referência ao que acabo de citar encontra-se na ‘filosofia dialogal’ de Martin Buber (1878-1965). Para quem o homem pode relacionar-se de duas formas com os outros: tomando-os por objetos (relação do tipo ‘EU-ISSO’) ou colocando-se na presença deles (EU-TU), onde “existir é coexistir”.
Para Buber, o homem só existe no mundo, compartilhando sua existência com tudo aquilo que está nele. Por isso dizer algo sobre o ‘ser humano concreto’ é compreender o homem em suas relações. Para o pensamento de Buber, essa troca entre seres (ou intersubjetividade) é o que o ser humano tem de mais essencial.
Aliás, Buber não nega a importância da relação EU-ISSO e dos avanços tecnológicos e científicos trazidos pelo domínio e compreensão da natureza. O filósofo no entanto nos mostra que existe outra forma de se aproximar do mundo, através da relação dialogal. Ou seja, além da dominação e controle do objeto que se faz presente.
Aasim é que o TU (o outro) foge de conceitos, esquemas, padronizações, pois  não se revela por força da vontade de um EU, mas simplesmente acontece. O mundo do TU é, neste sentido, arriscado, inseguro. Não somos capazes, como na relação EU-ISSO, de construir um sistema no qual podemos nos refugiar, dominando nosso objeto. Ao dizer TU não temos um objeto diante de nós, mas uma presença.
O que Buber faz, portanto, é convidar-nos a ter coragem de ultrapassar a segurança do ISSO (dos fenômenos controláveis) para nos aventurarmos no reino misterioso do TU, independentemente do grau de afetividade que esteja envolvido nessa relação com o outro (relacionamento amoroso, conjugal, de parceria, de amizade, de parentesco, profissional, coleguismo, etc.).  No sentido desse encontro e das trocas possíveis, usando somente nossa ‘presença’ como ferramenta, moldamos a HUMANIDADE, fonte de conhecimentos e de inter-relacionamentos infinita e de fortes sentimentos de realização.
Concluindo, o CIÚME, é sofrimento porque nos traz limitação para realizações verdadeiramente humanas.   Preservá-lo é motivo de sofrimento para todos !

Cuide-se bem...!!!!

Márcia Coutinho
Psicóloga e Sexóloga
CRP/06-81.855



RESENHA
Livro: CIÚME - O lado amargo do amor (FERREIRA-SANTOS, E., 2007)

Numa abordagem ao mesmo tempo profunda e envolvente, Eduardo Ferreira-Santos mostra a importância da reflexão e do diálogo para que se possa entender e vencer o ciúme – sentimento contraditório e frequentemente agressivo. A obra discute não apenas as reflexões da psicologia acerca do tema, como apresenta referências da mitologia, história, teologia e literatura, fazendo deste livro uma contribuição efetiva para o melhor entendimento da natureza múltipla do ciúme e um instrumento sensível para a conquista de uma vida conjugal mais plena e amorosa.
O autor, que é psiquiatra, mergulha no tema do ciúme, mostrando as causas de seu surgimento e suas consequências para as relações afetivas – como dependência, perda de autoestima e até distúrbios psicológicos graves. Ele também aponta saídas para situações neuróticas. Afinal, o ciúme acaba transformando o amor, sentimento altruísta por natureza, no mais exacerbado egoísmo.
Santos afirma que existem quatro tipos de ciumentos: o zeloso, o enciumado, o ciumento e o delirante, este último capaz de atos extremos caso se sinta traído. Ele afirma que se analisarmos mais detalhadamente o ciúme, podemos perceber, logo de início, que não se trata de um sentimento voltado para o outro, mas sim voltado para si mesmo, para quem o sente, pois é, na verdade, o medo que alguém sente de perder o outro ou sua exclusividade sobre ele. É um sentimento ego-centrado, que pode muito bem ser associado à terrível sensação de ser excluído de uma relação. O normal, mais comum, é a pessoa sentir-se enciumada em situações eventuais nas quais, de alguma forma, se veja excluído ou ameaçado de exclusão na relação com o outro.Santos acentua que em um grau maior de comprometimento emocional, quando há uma instabilidade neurótica ou de autoafirmação, a pessoa pode apresentar-se como ciumento. Neste caso, a sensação permanente de angústia e instabilidade, a insegurança em relação a si mesmo e ao outro, além da fragilidade da relação afetiva, podem levar a pessoa a manter um permanente "estado de tensão", temendo ser traído ou abandonado. Qualquer sinal do outro pode significar algo e a angústia da dúvida corrói a alma de quem é ciumento. Em uma terceira situação, ainda mais grave sob o ponto de vista de comprometimento do psiquismo, podem ocorrer situações delirantes em que a desconfiança do ciumento cede lugar a uma certeza infundada de que está mesmo sendo traído ou abandonado.
O ciumento vive um eterno sofrimento, e acaba experimentando stress, descontrole emocional, terminando por causar um tremendo clima de tensão e desajuste familiar, aliando a este clima cenas públicas constrangedoras para ela e para a família. Esse tipo de ciúme é conhecido como "Síndrome de Otelo", em referência ao personagem shakespeariano que sofria deste mal, e pode levar a pessoa a cometer atos de extrema agressividade física, configurando aqueles casos que recheiam as crônicas policiais de suicídios e homicídios passionais.Enquanto os casos mais brandos de ciúme podem ser uma manifestação de má estruturação da autoestima, os intermediários refletirem estados neuróticos, os casos da "Síndrome de Otelo" são, indiscutivelmente causados por patologias psiquiátricas graves.
De qualquer forma, o complexo sentimento de ciúme, longe de ser aquele "condimento" que toma a relação amorosa mais "apetitosa", é um sentimento que leva, via de regra, ao sofrimento de quem o sente e, principalmente, de quem padece nas mãos de um ciumento desconfiado e agressivo. Nas palavras do escritor Eduardo Ferreira-Santos, o ciúme é, em última análise, um SINAL DE ALERTA! É uma "luz vermelha" que se acende no painel da vida, indicando que algo está falhando. Seja em um ou no outro, seja na relação, algum "ruído" está denunciado pelo ciúme. Quanto mais intenso e menos controlável maior o problema. Quanto maior a intensidade desse sentimento, mais estaremos ultrapassando os limites da normalidade, para, aos poucos, podermos ser devorados por uma obsessão capaz de destruir qualquer relacionamento.

Avalie a intensidade de seu ciúme
(O teste é o mesmo para homens e mulheres)

Fonte: O psiquiatra Eduardo Ferreira-Santos, médico-supervisor do
 Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas e autor de dois livros
sobre o assunto (CiÚME - O medo da perda, 1998 e CIÚME - O lado amargo do
Amor, 2007), elaborou este teste a pedido da Revista VEJA

(Nota do Blog:  Importante acrescentar que esta avaliação não tem nenhuma acuidade, nem pretensão psicológica, servindo somente para exemplificação  de comportamentos possivelmente objetivados numa relação afetiva)
1. Seu (sua) parceiro(a) telefona do trabalho e diz que terá de viajar a negócios por dois dias
a) Você pergunta se precisa de alguma ajuda, deseja-lhe boa viagem e sorte nos negócios
b) Sente certo desconforto e pede mais detalhes da viagem. Procura saber com quem vai viajar e se encontrar, onde vai ficar e em que telefone pode ser localizado(a)
c) Sente-se ameaçada(o) com a possibilidade de ele(a) conhecer e se interessar por outra pessoa
d) Acha que é mentira ou que a viagem é pretexto para um encontro romântico

2. Quando seu (sua) parceiro(a) volta de viagem
a) Você o (a) recebe carinhosamente e demonstra interesse pelo trabalho que realizou
b) Você o (a) recebe bem, mas quer saber detalhes do que fez e com quem esteve
c) Você o (a) recebe com desconfiança. Vasculha os bolsos e a mala em busca de evidências de traição, checa a memória do celular e o (a) enche de perguntas
d) Você o (a) recebe com agressividade. Faz acusações, ameaças e não aceita explicações

3. Você vai com seu (sua) parceiro(a) ao shopping center

a) Caminha normalmente a seu lado e o (a) ajuda nas compras
b) Ao entrar em uma loja, com uma (um) vendedora(or) atraente, você presta mais atenção na maneira como conversam do que na compra em si
c) Se percebe a presença de alguém atraente, nem entra na loja. Procura outro caminho e fica amuada(o)
d) Desconfia o tempo todo que seu (sua) parceiro(a) está olhando em excesso para o sexo oposto e vice-versa

4. Você e seu (sua) parceiro(a) encontram casualmente uma (um) ex-namorada(o) dele(a)

a) Você reage com naturalidade e conversa normalmente
b) Não consegue se manter indiferente e tenta atrair para você a atenção do(a) parceiro(a)
c) Você fica perturbada(o), quer ir embora ou cria situação de confronto com o(a) parceiro(a) ou com a(o) ex
d) Você fica transtornada(o). Imagina uma trama entre eles e pode tomar atitudes destemperadas, como agressões verbais ou físicas

5. Você entra no quarto e seu (sua) parceiro(a) está desligando o telefone

a) Pergunta simplesmente quem era
b) Especula sobre quem era e qual o teor da conversa
c) Aproveita a primeira oportunidade para confirmar a identidade do interlocutor
d) Acha que a ligação foi interrompida por se tratar de traição amorosa

6. Você e seu (sua) parceiro(a) saem para jantar com um grupo de amigos. neste dia, vai junto a (o) prima (o) de um dos amigos que está de passagem pela cidade

a) Você recebe bem a (o) convidada(o) e se esforça para integrá-la(o) ao grupo
b) Vê a (o) convidada(o) como rival e consciente ou inconscientemente se compara a ela(e). Fica alerta para o interesse do(a) parceiro(a)
c) Sente-se mal e chega a se tornar agressiva(o) e criar situações embaraçosas
d) Acha que os amigos tramaram isso de propósito e tem certeza de que seu parceiro(a) está se envolvendo com a (o) convidada(o)

7. Seu (sua) parceiro (a) tem um encontro habitual com amigos do mesmo sexo, do qual você não participa

a) Você o (a) incentiva e acha natural que tenha o espaço dele(a), afinal você faz o mesmo
b) Acha natural, desde que saiba com quem vai sair, aonde vai e como pode localizá-lo(a)
c) Você não gosta, mas se vê obrigada(o) a engolir. Controla o horário da chegada e liga durante o encontro no bip ou celular para se certificar de que está mesmo com os (as) amigos(as)
d) Não admite e é capaz de atos extremos para impedi-lo(a) de sair

8. Seu (sua) parceiro(a) atrasa-se para voltar para casa

a) Você se preocupa e pensa que algo de ruim pode ter acontecido. Quando chega, sente alívio
b) Você se preocupa. Passa-lhe pela cabeça a possibilidade de algum transtorno, mas também a leve desconfiança de traição. Quando chega, pede explicações e acredita no que ele(a) diz
c) Enfurece-se e imagina que ele(a) está se divertindo com alguma (algum) namorada(o). Recebe-o(a) de maneira áspera e desconfiada
d) Tem certeza de que está sendo traída(o) e o (a) recebe de maneira extremamente agressiva.

Pontuação:
Respostas tipo a: ________
Respostas tipo b: ________
Respostas tipo c: ________
Respostas tipo d: ________
Avaliação:
Maioria das respostas AVocê é uma pessoa zelosa, que cuida da relação, confia em si e no (a) parceiro (a).   ALERTA: cuidado apenas para que o excesso de confiança não se torne descuido.
Maioria das respostas BVocê está na faixa da normalidade. Zela pelo relacionamento e está atenta (o) a situações ameaçadoras. ALERTA: só não deixe a sensação de ameaça tomar conta.  
Se A e B estiverem em equilíbrioVocê está na situação ideal. Cuida do relacionamento e só se preocupa quando percebe ameaças reais.
Maioria das respostas CVocê é uma (um) ciumenta (o) típica (o). Algo vai mal com você, com seu parceiro(a) ou com o relacionamento.
Maioria das respostas D
Procure ajuda especializada. Seu comportamento é característico da chamada síndrome de Otelo, o ciúme no mais alto grau, com risco de agressões físicas e outras baixarias.

FONTES ( ou para saber mais):

- BALLONE, G.J.. Ciúme Patológico. In: PsiqWeb - Psiquiatria Geral. 2004.  
- BUBER, Martin. Eu e Tu. 8.ed. São Paulo: Centauro, 2004.
- OLIVEIRA, Tiago L. T. de. A intersubjetividade em Martin Buber.
  Consciência.org - Filosofia e Ciências Humanas. 2005. Disponível em  
- FERREIRA-SANTOS, E.. Site Pessoal e Profissional. Disponível em:
   http://www.ferreira-santos.med.br/index.html.

Nenhum comentário:

Postar um comentário